
A plataforma de streaming Max voltará a se chamar HBO Max em breve. Para alguns, o anúncio foi uma surpresa. Para outros, é a decisão mais lógica. Mas a dúvida que permanece é: o que essa mudança de identidade representa para o conteúdo original, incluindo o brasileiro?
Nesta quinta-feira, durante o Rio2C —evento de inovação e criatividade realizado no Rio de Janeiro— a Warner Bros. Discovery, responsável pelo serviço, começa a esclarecer parte dessa estratégia. Antecipando a apresentação, esta coluna de Splash traz com exclusividade uma entrevista com Mônica Pimentel, vice-presidente de conteúdo e diretora de gestão de talentos da empresa no Brasil. Entre outros assuntos, ela revela que a meta é manter o ritmo de pelo menos uma novela brasileira inédita por ano, após "Beleza Fatal".
Ao falar sobre os valores que sustentam essa retomada, Mônica é enfática: "Não existe nenhuma outra marca que se destaque tanto por qualidade e histórias únicas como a HBO". Ela tem razão.
Fundado nos Estados Unidos em 1972 pelo bilionário Charles Dolan, e depois vendido para o grupo Time Inc., o canal atravessou décadas no mercado norte-americano e se fixou no imaginário popular por meio de séries como "Família Soprano", "Game of Thrones", "Sex and the City" e, mais recentemente, "Succession" e "The Last of Us". No Brasil, atracou na TV paga em 1994 e teve também seus sucessos locais, como "Mandrake" (estrelado por Marcos Palmeira) e "O Negócio".
Isso sem mencionar os lançamentos de estúdios como Warner Bros. e Sony, que chegam ao catálogo poucos meses após a estreia nos cinemas.
Quando lançou a sua iniciativa de vídeo sob demanda por para concorrer com a Netflix, a então WarnerMedia embarcou na marca HBO Max, puxando essa herança —com o "Max" representando as outras divisões do conglomerado, como DC, TNT Sports, Cartoon Network e tantas outras. Em 2023, após a fusão com a Discovery, decidiram abandonar o prefixo. Era uma época em que os streamings eram pressionados a aumentar a quantidade de lançamentos semanais.
"Nós entendemos que, com as mudanças mais recentes do mercado, que o interesse do consumidor está cada vez mais voltado para conteúdos de qualidade. Hoje, você não vê mais ninguém falar que quer volume. As pessoas querem conteúdos que façam sentido, que ressoem, que conectem de fato com aquilo que elas estão esperando", conta Mônica Pimentel —refletindo o discurso público de David Zaslav, CEO da WBD.
"Primeiro, vimos um crescimento muito acelerado dos players do mercado em geral, seguido por um período de ajustes estratégicos, onde eles estão cada vez mais focados não só em conquistar audiência, mas também em garantir sustentabilidade financeira e oferecer conteúdo de alto impacto", detalha a executiva.
A marca evolui diante do que temos de entendimento do consumidor. Mônica Pimentel, vice-presidente de Conteúdo e diretora de Gestão de Talentos da WBD Brasil
Como ficam as produções nacionais?
Com esse discurso, a pergunta que fica na ponta da língua é: significa que teremos menos originais brasileiros na Max —ou melhor, HBO Max? A executiva esclarece: não.
"Hoje, temos 60 projetos locais em andamento, em diferentes estágios —desde desenvolvimento, pré-produção, produção", afirma. "Mas o que é importante é que estamos muito criteriosos nos títulos, muito empenhados no desenvolvimento e na qualidade de produção para poder entregar o melhor".
Para Mônica Pimentel, a busca é por histórias autênticas —mesmo quando são temas já debatidos anteriormente. A intenção é trazer algo novo, com um enredo envolvente, e com características de uma boa produção— incluindo narrativa, direção, roteiro e elenco. "Se for ficção, temos buscado muitas IPs [propriedades intelectuais], né?", compartilha.
Um exemplo mencionado pela vice-presidente é "Véspera", série estrelada por Gabriel Leone (de "Senna") e Bruna Marquezine, que é baseada no livro de Carla Madeira.
Buscamos estrategicamente, em todas as 52 semanas do ano, poder oferecer algo novo —mas que seja impactante, que realmente tenha qualidade. Acredito que esse é um compromisso que está no DNA da nossa plataforma. Mônica Pimentel, da WBD
Histórias que ganham o mundo
Uma das novas dinâmicas do conteúdo é a necessidade de contos com um sabor local, mas que tenham um apelo global. É o chamado de "glocal", junção das duas palavras.
Aquela realidade em que todos consumiam um filme ou uma série terrivelmente norte-americanas ficou no ado. Da mesma forma, produtores regionais que possuem grandes ambições buscam agora se aliar com distribuidores e plataformas globais.
Mônica Pimentel garante que a Warner também está de olho nisso, mas que é um desafio encontrar o equilíbrio. "Nem sempre uma história muito regional vai viajar. E se começarmos a transformar demais para algo que tenha mais aderência internacional, podemos perder o sabor local", explica a executiva.
"O nosso primeiro critério é que ela emplaque localmente, que seja relevante, que se conecte primeiro com o público local. E, aí sim, será desejável, logicamente, que ela também possa fazer sucesso fora [do país]"
Se você não emplacar no Brasil [com uma produção original local], não vai emplacar fora. Mônica Pimentel, da WBD
Como exemplo de sucesso, Mônica não titubeia em nomear "Beleza Fatal". "Viajou por toda América Latina, Estados Unidos, Europa...", compartilha.
E se a primeira novela do streaming contou com uma ambientação urbana, mais ligada ao eixo Rio-São Paulo, isso vai mudar com "Dona Beja", folhetim que tem estreia prevista na Max em 2026 —e que tem nomes como Grazi Massafera, Bianca Bin e Deborah Evelyn no elenco. A trama de época é um remake de "Dona Beija", da extinta TV Manchete.
"Já estamos em desenvolvimento com outros dois títulos [do gênero], ainda numa fase bastante inicial, mas trabalhando para que consigamos manter pelo menos uma novela por ano", revela Mônica.
Para além do tradicional formato brasileiro, a Max está também preparando novas séries nacionais. Uma delas é "Ângela Diniz: O Crime da Praia dos Ossos", sobre o assassinato da socialite mineira por seu então namorado, o playboy Doca Street. Um tema intimamente ligado ao Brasil, mas que toca em assuntos universais —como o feminicídio e a misoginia, além de estar ligado à febre do true crime. A direção é de Andrucha Waddington ("Vitória", "Eu, Tu, Eles") e o elenco conta com Marjorie Estiano e Emílio Dantas nos papéis principais.
Outra estreia que está em desenvolvimento é "Máscaras de Oxigênio (não) Cairão Automaticamente", sobre um grupo de comissários de bordo que resolve aproveitar suas constantes viagens ao exterior para contrabandear o AZT, medicamento retroviral para o tratamento da infecção pelo vírus HIV —isso em pleno anos 1980. Mais uma vez, um tema muito brasileiro, mas com apelo mundial. O elenco conta com nomes como Bruna Linzmeyer, Andréia Horta e Johnny Massaro.
Para o de hoje no Rio2C, a Warner pretende apresentar algumas novidades exclusivas sobre essas produções, além de trazer algumas estrelas para o palco principal do evento.
Até porque, vamos combinar: o streaming pode se chamar Max, HBO Max ou até ressuscitar o velho HBO Go. No fim das contas, o que o público realmente deseja é simples: o vídeo rodando sem travar e um conteúdo que justifique o valor da mensalidade.
Todo o resto? É problema para o marqueteiro justificar em slides e planilhas.
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