Em Paris, Lula pressiona Macron a fechar acordo Mercosul-UE
Em Paris, Lula pressiona Macron a fechar acordo Mercosul-UE - Presidente brasileiro pediu para o homólogo francês abandonar o protecionismo. Macron rebateu propondo clásula fitossanitária comum. Líderes também discordaram de posicionamento sobre Ucrânia.O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu nesta quinta-feira (05/06) a seu homólogo francês Emmanuel Macron que não se oponha ao acordo comercial negociado entre a União Europeia e o Mercosul. A França tem rejeitado a ratificação do tratado devido ao receio de que um fluxo de produtos agrícolas de custo mais baixo possa pressionar agricultores europeus.
"Assumirei a presidência do Mercosul em 6 de junho, por seis meses. Quero dizer a vocês que não deixarei a presidência do Mercosul sem concluir o acordo com a UE. Por isso, meu caro [Macron], abra seu coração para fechar este acordo", disse Lula durante uma coletiva de imprensa ao lado de Macron, em Paris.
Lula desembarcou na capital sa para a primeira visita de Estado de um presidente brasileiro ao país em 13 anos. Esta é também a oitava vez que os dois líderes se encontram.
"Esse acordo seria a resposta mais forte que nossas regiões poderiam oferecer diante da incerteza causada pelo retorno do unilateralismo e do protecionismo tarifário", acrescentou, referindo-se às tarifas impostas pelo presidente dos EUA, Donald Trump.
Macron, no entanto, argumentou que os seis meses mencionados por Lula poderiam ser usados ??para "melhorar" o pacto, mas não para assiná-lo da forma como está.
"Temos seis meses para melhorá-lo, com cláusulas recíprocas, porque o acordo como está não é bom para o clima nem justo [para os agricultores]", disse Macron.
"Não sei como explicar aos meus agricultores que, em um momento em que estou pedindo que eles cumpram mais normas, [e no outro] estou abrindo meu mercado em grande escala para pessoas que não cumprem nada", continuou o presidente francês. "Não será melhor para o clima, mas destruiremos completamente nossa agricultura."
Macron defende cláusula de reciprocidade
Macron sofreu mais de uma onda de intensas manifestações de agricultores contra o acordo de livre-comércio. A disputa chegou a gerar um ruído diplomático após o CEO do Grupo Carrefour na França, Alexandre Bompard, dizer que a rede varejista não compraria mais carne do Mercosul em razão de o produto não atender as exigências europeias.
O executivo precisou recuar da declaração e pedir uma desculpa formal ao governo brasileiro.
Ao lado de Lula, Macron defendeu uma cláusula de reciprocidade, que aplicaria os mesmos padrões fitossanitários em ambos os blocos, e uma cláusula de "freio", que paralisaria parte do acordo caso um setor específico fosse desestabilizado em decorrência de uma concorrência considerada desleal.
O brasileiro rebateu que o protecionismo é "coisa do ado" e expressou surpresa que os europeus, que estavam na vanguarda do livre-comércio há algumas décadas, sejam agora os defensores das barreiras comerciais. Ele também reforçou a preocupação brasileira em combater o desmatamento.
Apesar de os termos já terem sido aceitos pela Comissão Europeia em dezembro ado, o texto do acordo Mercosul-UE ainda precisa ser revisado juridicamente, traduzido, assinado e chancelado pelos membros dos blocos.
Para ser aprovado, o acordo precisa do apoio de pelo menos 15 dos 27 estados da UE.
Guerra na Ucrânia e em Gaza
O embate entre Lula e Macron revela os temas que os dois presidentes disputam, apesar de uma relação consolidada criada antes mesmo da eleição que levou o brasileiro ao seu terceiro mandato no Planalto.
Entre os tópicos está a postura sobre a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, que Lula condena, mas sem acusar diretamente Moscou.
No encontro, o presidente brasileiro se disse comprometido a intermediar a paz entre os países. Já Macron instou Lula a pressionar Moscou. Ele defendeu que o lado russo é o agressor e que esse fato precisa ser levado em conta para se decidir o fim dos conflitos.
Sobre o conflito em Gaza, Lula voltou a acusar Israel de realizar um "genocídio". "É um genocídio premeditado de um governo de extrema direita que está travando uma guerra contra os interesses de seu próprio povo", disse ele.
Macron, por outro lado, não tratou o conflito sob o mesmo termo. Em maio, ele já havia dito que não cabe a um "líder político usar o termo, mas que caberia aos historiadores fazê-lo quando chegasse a hora".
Acordos bilaterais
Os presidentes também usaram o encontro para 20 instrumentos bilaterais, em áreas como meio ambiente e segurança.
Entre os projetos acordados está o Programa de Desenvolvimento de Submarinos, anunciado pelo Planalto como "a maior iniciativa de cooperação em defesa já empreendida" pelo Brasil. "Seu legado é o de garantir a soberania brasileira sobre nosso vasto espaço marítimo, além de construir um dos estaleiros mais modernos no mundo em Itaguaí, no Rio de Janeiro", disse Lula.
Os dois governos também discutem uma nova encomenda de aeronaves para o Brasil e a Polícia Federal de ambos coordenam esforços para combater o tráfico, o garimpo ilegal e o desmatamento na região da Amazônia.
Outros dois atos assinados nesta quinta-feira focam na cooperação para produção de hidrogênio de baixo carbono e de descarbonização do setor marítimo.
gq (reuters, afp, efe, ots)